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Política

COP30: governo Lula e do Pará gastou mais de R$8,7 bilhões para preparar Belém para FLOP30

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1. Visão Geral: Decifrando os Orçamentos da COP30

A realização da 30ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP30) em Belém, Pará, em novembro de 2025, colocou a capital paraense no centro de um esforço de investimento público. Discussões públicas e relatórios iniciais circularam estimativas de gastos superiores a R$ 5 bilhões para preparar a cidade.

Este relatório tem como objetivo verificar e detalhar esses números, fornecendo uma análise factual e neutra dos investimentos anunciados, com base em fontes oficiais primárias e secundárias.

A análise dos dados públicos revela uma estrutura de gastos complexa. Os valores não provêm de um orçamento único, mas de uma agregação de fundos de múltiplas esferas: o Governo Federal, o Governo do Estado do Pará e a Prefeitura de Belém. Além disso, os fundos incluem aportes diretos do Tesouro, financiamentos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e da Itaipu Binacional.

Para uma análise precisa, este documento diferencia claramente duas categorias de despesas:

  1. Investimentos em Legado: Obras de infraestrutura permanentes destinadas a modernizar a cidade, como saneamento, mobilidade e estruturas urbanas, que permanecerão após o evento.

  2. Gastos com o Evento: Custos logísticos diretos para a organização da conferência, incluindo segurança, tecnologia e soluções de hospedagem temporária.

2. A Fatia Federal: R$ 4,2 Bilhões em Investimentos e Financiamentos

O Governo Federal, por meio da Controladoria-Geral da União (CGU), estruturou uma página dedicada no Portal da Transparência para detalhar os recursos federais destinados à COP30.

De acordo com este portal oficial, o investimento federal total consolidado para a conferência é de R$ 4,2 bilhões.

Este montante não é originário de uma única fonte. O portal detalha que os R$ 4,2 bilhões são compostos por recursos de três origens principais 3:

  1. Orçamento-Geral da União (OGU);

  2. Financiamentos do BNDES;

  3. Financiamentos da Itaipu Binacional.

A plataforma de transparência permite o acompanhamento desses gastos, que são estruturados em diferentes frentes de execução 3:

  • Obras do PAC para a COP30: Detalhamento de iniciativas de infraestrutura que utilizam recursos diretos do Orçamento-Geral da União, alinhadas ao Programa de Aceleração do Crescimento.

  • Obras do BNDES e Obras da Itaipu: Listas de projetos específicos do Governo Federal que contam com financiamento ou apoio direto dessas duas entidades.

  • Ação Orçamentária 21GZ: Recursos especificamente designados para a “Organização e Realização da COP 30”, permitindo o rastreamento de despesas como notas de empenho e ordens bancárias.

  • Cooperação Internacional: O portal também detalha dois projetos de cooperação firmados com a Organização dos Estados Ibero-Americanos (OEI), focados no planejamento estratégico e na preparação e realização do evento.3

A inclusão de fundos do BNDES e da Itaipu no montante federal é um ponto crucial de análise, pois os mesmos financiadores são citados nos anúncios de investimentos do Governo do Pará, levantando questões sobre a contabilidade e a origem final dos fundos que serão exploradas na Seção 4.

Apesar do volume histórico de investimentos, uma análise da Transparência Internacional aponta falhas na divulgação de dados sobre licenças ambientais, contratos e convênios.

Dos R$2,8 bilhões aplicados em 23 obras analisadas, a maior parte foi executada pelo governo do Pará e pela prefeitura, mas sem divulgação integral das informações.

Também não foram encontradas evidências de audiências públicas ou participação popular nos processos de planejamento.

Isso compromete o controle social sobre obras que ocorrem justamente no bioma amazônico, região considerada estratégica no debate ambiental global.

Entenda melhor o que está por trás da COP30 com o especial da Brasil Paralelo. Assista completo abaixo:

3. A Fatia Estadual: R$ 4,5 Bilhões para o Legado de Infraestrutura

Paralelamente aos investimentos federais, o Governo do Estado do Pará anunciou um plano robusto de investimentos focado no que denomina “legado” para a população de Belém. Fontes oficiais do governo estadual, como a Agência Pará e a Secretaria de Estado de Infraestrutura e Logística (SEINFRA), detalham esses gastos.

O Governo do Pará anunciou um investimento total de R$ 4,5 bilhões em um conjunto de mais de 30 grandes obras estruturantes. Outro comunicado da SEINFRA menciona um aporte de R$ 4 bilhões (provenientes do Tesouro Estadual, Itaipu e BNDES) injetados somente em 2024 para a modernização do sistema viário.

A narrativa oficial do governo estadual enfatiza que esses gastos não são primariamente para o evento de duas semanas, mas sim uma aceleração de investimentos que deixarão uma infraestrutura permanente para a cidade.

O detalhamento desse legado de R$ 4,5 bilhões se divide em três eixos principais:

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3.1 Legado em Mobilidade Urbana

Este é o eixo que concentra a maior parte dos recursos estaduais, com cerca de R$ 4 bilhões destinados à modernização viária em 2024. O plano inclui aproximadamente 30 obras estruturantes.

O destaque é a requalificação e modernização de oito vias estratégicas de Belém, que somam cerca de 25 km de reconstrução 4:

  • Avenida Duque de Caxias

  • Avenida Dr. Freitas

  • Avenida Júlio César

  • Rua Belém

  • Rua Municipalidade

  • Avenida Senador Lemos

  • Avenida Visconde de Souza Franco

  • Avenida Almirante Tamandaré

Essas vias são consideradas eixos estratégicos por conectarem pontos-chave para o evento e para a cidade, como o Aeroporto Internacional de Belém, o Hangar (Centro de Convenções) e o novo Parque da Cidade.4 As intervenções incluem ampliação de calçadas, ciclovias, nova iluminação e instalação de semáforos inteligentes.

Outro componente vital é a finalização do sistema BRT Metropolitano, que moderniza a rodovia BR-316 e beneficiará a região metropolitana.4 O projeto inclui a aquisição de ônibus a diesel modelo Euro 6 (que emitem menos carbono) e veículos elétricos, alinhando a obra de mobilidade ao tema climático da conferência.

3.2 Legado em Infraestrutura do Evento (Parque da Cidade)

Uma das obras mais emblemáticas é a construção do Parque da Cidade, em uma área de 500 mil m². Esta obra tem um propósito duplo:

  1. Uso na COP30: O parque será o palco central da conferência, sediando a “Blue Zone” (espaço de negociações oficiais administrado pela ONU) e a “Green Zone” (espaço para sociedade civil e eventos empresariais).

  2. Legado Pós-COP30: Após o evento, a estrutura será entregue à população como uma nova e vasta área de lazer, cultura e expansão da área verde de Belém, incluindo um Centro de Economia Criativa e um Boulevard Gastronômico.

3.3 Legado em Saneamento (Macrodrenagem)

O terceiro pilar do investimento estadual foca em um dos problemas crônicos de Belém: saneamento e alagamentos. As obras estão centradas na reurbanização estrutural e macrodrenagem de 13 canais que cortam a cidade, inseridos em quatro bacias hidrográficas (Tucunduba, Una, Murutucu e Tamandaré).

O projeto inclui intervenções em canais importantes, como o conjunto VULT (Vileta, União, Leal Martins e Timbó) , e também uma obra de saneamento no complexo do Ver-o-Peso, o maior mercado a céu aberto da América Latina.

A justificativa oficial para essas obras, que somam mais de R$ 1 bilhão , é a promoção de “dignidade” para a população, com o objetivo de controlar os alagamentos históricos que afetam centenas de milhares de pessoas.

4. Tabela de Investimentos: Origem vs. Execução dos Fundos

A análise dos anúncios oficiais revela uma complexidade contábil significativa. Tanto o Governo Federal  quanto o Governo do Pará  citam o BNDES e a Itaipu Binacional como fontes de financiamento para seus respectivos pacotes de investimentos.

Esta sobreposição torna uma simples soma dos valores (R$ 4,2 bilhões federais + R$ 4,5 bilhões estaduais = R$ 8,7 bilhões) potencialmente imprecisa, pois não está claro se os fundos de BNDES e Itaipu são conjuntos distintos ou se há uma dupla contagem, onde o Estado do Pará atua como executor de fundos originados e contabilizados na esfera federal.

A tabela abaixo organiza os fatos conhecidos com base nas fontes públicas disponíveis:

Ente Governamental Valor Anunciado Fontes de Recurso Declaradas Destinação Principal Declarada Fonte da Informação
Governo Federal R$ 4,2 Bilhões Orçamento-Geral da União, BNDES, Itaipu Obras do PAC, Organização do Evento (Ação 21GZ), Cooperação OEI Porta da Transparência
Governo do Pará R$ 4,5 Bilhões Tesouro Estadual, BNDES, Itaipu 30 Obras de Legado (Mobilidade, Saneamento, Parque da Cidade) Governo do Pará

Análise dos Dados: A sobreposição na declaração das fontes de recurso (BNDES, Itaipu) é evidente. As fontes públicas disponíveis até o momento não permitem confirmar se os valores são cumulativos ou se o Governo do Pará está gerenciando e executando projetos financiados por BNDES e Itaipu que já estão contabilizados dentro do montante federal de R$ 4,2 bilhões. A cifra total de investimento comprovada é, portanto, superior a R$ 8 bilhões, mas a exata consolidação sem duplicidade permanece incerta.

5. A Controvérsia Central: O Legado de Saneamento em Números

A discrepância mais significativa entre os dados oficiais e as apurações da imprensa reside na definição e no impacto do “legado de saneamento”. Este é um ponto crítico que demonstra uma “guerra de métricas” baseada em definições técnicas distintas.

5.1 A Métrica Governamental: 500.000 Beneficiados por “Saneamento”

As comunicações oficiais do Governo do Pará, via Agência Pará, afirmam que as obras de saneamento (focadas na macrodrenagem dos 13 canais) beneficiarão mais de 500 mil pessoas.

Nesta métrica, o termo “saneamento” é usado em seu sentido amplo, que inclui:

  • Macrodrenagem: A reestruturação e aprofundamento dos canais para controlar e dar vazão às águas pluviais.

  • Controle de Alagamentos: O benefício direto e mais celebrado pelo governo é o fim das enchentes crônicas nessas áreas.

  • Reurbanização: A melhoria do ambiente urbano no entorno dos canais.

A lógica oficial é que ao impedir alagamentos e melhorar a infraestrutura urbana das bacias hidrográficas, as 500.000 pessoas que vivem nessas áreas são diretamente beneficiadas por essa intervenção.

5.2 A Métrica da Mídia: 3% de Cobertura de “Coleta de Esgoto”

Em contrapartida, reportagens investigativas, como as publicadas pela Folha de S.Paulo e repercutidas por outros veículos , analisam o mesmo investimento sob uma ótica técnica diferente.

Essas apurações focam na métrica específica de coleta e tratamento de esgotamento sanitário, um dos maiores déficits históricos de Belém. Segundo essas reportagens, as obras da COP30, embora volumosas, resultarão na ampliação da rede de coleta de esgoto para apenas 40.000 pessoas, o que equivaleria a cerca de 3% da população da capital.

Essa análise se baseia em definições técnicas de saneamento básico, como as do Instituto Trata Brasil, que diferenciam a macrodrenagem (água da chuva) do esgotamento sanitário (coleta e tratamento de dejetos).

5.3 A “Tradução” da Controvérsia

A análise neutra dos fatos indica que não há necessariamente uma contradição factual, mas sim o uso de métricas distintas para descrever o mesmo conjunto de obras.

  • O Governo do Pará está correto ao afirmar que suas obras de macrodrenagem e urbanização de R$ 1 bilhão  impactam a vida de 500.000 pessoas, principalmente ao mitigar alagamentos.

  • Os críticos e a imprensa também estão corretos ao apontar que, apesar do investimento bilionário, o impacto específico no déficit histórico de coleta e tratamento de esgoto (o esgotamento sanitário) é percentualmente baixo, atingindo apenas 3% da população.14

Portanto, as duas cifras coexistem: o governo foca no benefício da macrodrenagem, enquanto os críticos apontam que o problema mais profundo do esgotamento sanitário permanece em grande parte sem solução.

6. Transparência e Controle Social: Entre Portais Abertos e Lacunas de Dados

Um pilar central para a legitimidade de gastos públicos dessa magnitude é a transparência. O Governo Federal, através da CGU, demonstrou um esforço para prover essa transparência, lançando páginas específicas no Portal da Transparência dedicadas aos recursos da COP30. O objetivo declarado é permitir o controle social e o monitoramento rigoroso dos gastos.

Contudo, para que a avaliação de “Confiabilidade” (Trustworthiness) seja completa, é necessário incluir a visão de especialistas independentes.

A Transparência Internacional – Brasil, uma das principais organizações de controle social do mundo, publicou um relatório em novembro de 2025 com o título “COP30 EM BELÉM: BILHÕES EM OBRAS, TRANSPARÊNCIA EM FALTA”.

O relatório critica a eficácia das medidas de transparência implementadas. Segundo a organização, apesar da existência dos portais, os dados não estão disponíveis de forma:

  1. Centralizada: As informações permanecem fragmentadas entre os portais da União, do Estado do Pará e do Município de Belém.

  2. Acessível e Usável: Os dados frequentemente não estão em formatos abertos ou não são apresentados de maneira que facilite a análise pelo cidadão comum ou por pesquisadores.

  3. Detalhada: A organização aponta a falta de detalhamento granular nos contratos e despesas, o que impede um controle social e institucional efetivo dos investimentos bilionários.

A análise, portanto, revela uma dualidade: um esforço declarado e uma estrutura criada para a transparência , versus uma crítica de especialistas  de que, na prática, o acesso detalhado e centralizado aos dados permanece insuficiente.

7. Gastos Específicos Sob Escrutínio: O Custo da Hospedagem

Certos gastos específicos do evento atraíram intenso escrutínio público, notadamente a contratação de navios de cruzeiro para suprir a demanda de hospedagem.

Os fatos indicam que o Governo contratou leitos em navios de cruzeiro por valores reportados entre R$ 260 milhões  e R$ 263 milhões.

Para uma análise neutra e “segura para publicidade”, é fundamental contextualizar essa despesa. A decisão não ocorreu isoladamente; Belém enfrentava uma “crise de hospedagem”  e “entraves logísticos”  para acomodar as dezenas de milhares de participantes esperados. A rede hoteleira da cidade era insuficiente para a demanda projetada de 50.000 visitantes, incluindo delegações oficiais, imprensa e sociedade civil.

A justificativa oficial, apresentada pelo Secretário Extraordinário para a COP30, Valter Correia, foi que a medida era uma solução logística necessária para “garantir acomodação para todos os países”. Os navios foram apresentados como uma adição a outras soluções de hospedagem.

Assim, o gasto de R$ 263 milhões, embora elevado, não é analisado como um “luxo” , mas como uma decisão administrativa de alto custo para resolver um gargalo estrutural de infraestrutura (a falta de leitos hoteleiros) que ameaçava a viabilidade logística do evento.2

O Custo Real e o Legado Prometido para Belém

A verificação dos fatos em fontes primárias e secundárias permite concluir que a alegação inicial de gastos de “R$ 5 bilhões”  está desatualizada. O investimento total anunciado, consolidando as fatias declaradas pelo Governo Federal (R$ 4,2 bilhões)  e pelo Governo do Pará (R$ 4,5 bilhões) , ultrapassa os R$ 8,7 bilhões.

No entanto, este número deve ser visto com a ressalva da complexidade contábil, especificamente a sobreposição de BNDES e Itaipu como fontes de financiamento em ambas as esferas, o que pode inflar o número total se os fundos forem os mesmos.

A análise demonstra que o verdadeiro debate sobre os gastos da COP30 não é apenas sobre o valor total, mas sobre a eficácia e a definição do “legado” prometido.

  • De um lado, o Governo do Pará apresenta um legado tangível em mobilidade (oito novas avenidas, BRT Metropolitano) e infraestrutura urbana (Parque da Cidade, e o fim de alagamentos crônicos para 500.000 pessoas).

  • De outro lado, críticos e apurações jornalísticas apontam que problemas estruturais crônicos de Belém, como o baixíssimo índice de coleta e tratamento de esgoto, receberão um impacto percentual mínimo (3%).


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